quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

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Helen: Dá pra vocês calarem a boca? Tô de saco cheio de ouvir vocês resmungando. Manu, é esse seu nome, né!? – Afirmei com a cabeça. – A casa agora também é sua. Mas pro bom funcionamento da casa, tem algumas regrinhas que devemos seguir aqui. Sente-se para conversarmos melhor.
Não falei nada, apenas segui as "ordens" de Helen. Sentei-me no sofá e as meninas sentaram no sofá ao lado. Helen sentou-se do meu lado e virou de frente pra mim.
Helen: Bom, todas as meninas tem tarefas domésticas a serem realizadas. As meninas organizaram-se entre elas e decidiram qual seria o dia de cada uma nos afazeres. Isso você combina com elas depois. Caso deixe de cumprir, fica sem a sua porcentagem a semana toda. Então, é melhor fazer. – Eu continuei quieta. Só assenti com a cabeça. – Não quero cenas na frente dos clientes. Vocês podem se odiar e se matar aqui, mas vão se tornar a melhores amigas do mundo quando algum cliente estiver por perto. Falta no trabalho, sem que o motivo seja doença ou algo realmente importante relacionado a escola, será cobrado de vocês e ficarão sem a porcentagem do dia. O cliente tem sempre razão. Você deve fazer exatamente o que foi paga pra ser feita e é pra fazer bem feito. 60% meu e 40% seu de cada programa feito. Ah, nem pense, em se meter com o meu filho. Todas aqui são permanentemente proibidas de se quer sonhar com o Guilherme – Esse nome me lembrou o menino que esbarrou em mim na rua enquanto eu ainda morava com os meus pais. Loucura pensar nisso agora. Voltei do mundo da lua quando Helen voltou a falar. – Estamos acertadas? Se houver mais alguma coisa que eu esqueci de falar, eu te conto depois.
Manuela: Ta bom, Helen. Obrigada por me deixar ficar.
Helen: Obrigada você, queridinha. E agora, vai tomar um banho. Tu ta realmente precisando. 
Flávia: Vem, eu te mostro o teu quarto.
Flávia me levou para um quarto grande. Haviam três camas ali, duas de casais e uma de solteiro. Pensei ser o quarto dela e de Amanda, já que elas eram as que pareciam mandar ali.
Manuela: A Amanda não vai se incomodar com a minha presença aqui?
Flávia: Por que? Ta louca? O quarto é meu e agora é seu também.
Manuela: Mas eu pensei que... – Fiz uma pausa e resolvi não seguir em frente na minha fala. – Deixa quieto.
Flávia: O.k. Eu durmo nessa cama aqui. Tu pode ficar em qual quiser. – Peguei a cama de casal que tinha sobrado e coloquei minha mala ao lado. – Agora vai tomar banho e depois veste isso aqui, ela abriu o guarda roupa e pegou um vestido bem curto para eu vesti-lo.
Flávia me deu uma toalha e eu tomei o banho mais demorado da história. Fiquei minutos debaixo do chuveiro, pensando no que minha vida viraria a partir dali. Chorei de soluçar e soquei a parede várias vezes, mais um roxo pra minha coleção. Terminei o banho e sai do mesmo mais aliviada e finalmente, limpa. Vesti o vestido minusculo que Flávia tinha me dado. Ela não estava mais no quarto quando eu sai do banho, decidi então descer para a sala com todas as meninas.

Coloquei juntamente com o vestido um salto divino que Flávia deixou em cima da cama. Me maquiei também. Flávia foi a primeira a me ver descendo as escadas.
Flávia: Caralho, tu ta uma gata. Eu tenho um dedo ótimo.
Helen: Está divina.
Bruna: Nossa, que gata. Mas se roubar meus clientes, te mato e faço parecer um acidente. – Dei risada.
Manuela: Prometo nem olhar pros teus clientes. – Sorri e ela deu uma piscadinha pra mim.
Amanda: Nada que uma maquiagem não salve.
Jack: Recalque de puta, Deus não escuta. Tu ta linda, Manu.
Manuela: Obrigada.
Flávia: Não sei se tu já sabe quem é quem, mas ó, essa é a Bruna. Ou Sufista, se tu preferir. Ela é a pirralha daqui. – Sorri para ela. – Essa é a Jack. Nossa negra linda. Essa é a alternativa, Luana. – Antes que Luana se manifestasse, Flávia se pronunciou: – Mas ela te enforca se chama-la assim, é Lua. – Ela revirou os olhos ao terminar de falar. – E essa é a chata e com muitos neurônios a menos, Amanda.
Manuela: Oi, meninas. – Abri um sorriso e dei uma ajeitada no cabelo.
Ao terminar as apresentações, nós combinamos em que dia eu ajudaria nas tarefas domésticas. Estávamos reunidas no sofá. Ouvi as histórias de como as meninas chegaram ali e contei a elas tudo sobre mim. Ou quase. Já estava anoitecendo quando a maçaneta da porta gira e a mesma se abre.
Um menino lindo, moreno e alto entra na casa. Opa, calma aí, eu conheço ele. Guilherme? Não, calma. Esse é o Guilherme filho de Helen? Que mundo minusculo.
Guilherme: E aí, piriguetes. – Ele deixou várias sacolas em cima da mesa de jantar e deu um beijo na testa da Helen. – Oi, mãe. – Ele olhou pra mim com estranheza. – Você eu não conheço – Ele ergueu uma sobrancelha.
Manuela: É, realmente não. Sou uma "estranha".
Guilherme: Ah, ta brincando que você é a estranha da rua que foi embora e nem me falou seu nome?
Lua: Ela era a menina linda e loira que tu falou esses dias?
Guilherme: Valeu por queimar o meu filme. – Ele pegou uma almofada e tacou nela.
Manuela: Manuela. A estranha chama Manuela. – Ele me achava linda? Bom saber.
Guilherme: Tu é a nova pirigue... Quer dizer, garota da minha mãe?
Manuela: Pode-se dizer que sim. Mas isso ainda é uma meia verdade. – Helen já havia saído da sala para preparar o jantar, as meninas estavam com as antenas ligadas no meu papo com o Guilherme.
Guilherme: Po, tu ta linda. – Ele olho pra cada centímetro do meu corpo. Me secou até o ultimo.
Manuela: Valeu. Flávia me falou pra vestir isso. É tudo novo pra mim ainda. To me acostumando.
Guilherme: Já já tu pega jeito. Po, eu vou subir pro meu quarto. Depois a gente se fala mais. – Ele passou por mim e me deu um beijo no rosto. As meninas só faltaram pular no meu pescoço.
Flávia: Nem pensar. Desencana. Ele é o rei e tu a plebeia. Nem se ilude. – Eu arregalei os olhos ao ouvi-las.
Manuela: Nossa, calma. Não to me iludindo. Eu entendi que vou me ferrar se me meter com ele.
Foi bem assustadora a reação das meninas. Mas achei besteira. Eu não queria problemas com ninguém, ainda mais com a Helen. Não era louca.
O resto do dia foi chato. Fui me deitar não muito tarde e fiquei horas enrolando pra dormir.
Minha mente estava a milhão. O medo era o mais forte dos meus sentimentos. Droga. O que eu tinha escolhido fazer com a minha vida? De menina espancada pelo pai a garota de programa. E pior não tinha minimamente chegado. A ideia de um programa, de homens de tudo quanto é jeito pegando em mim, me tocando, transando comigo me causou repulsa. Eu estava decepciona. Com medo. Morrendo de medo.
Peguei no sono em seguida. Acordei cedo, fiz minha higiene e desci pra comer alguma coisa.
Havia alguém deitado no sofá e assistindo a tv num volume baixo. Andei discretamente até a pessoa e vi Guilherme, quase pegando no sono. Resolvi voltar pra trás e subir, mas ao virar, bati no sofá sem querer. Merda.
Guilherme: Que susto. – Ele arregalou os olhos e depois se espreguiçou. 
Manuela: Ai, mil perdões, sério. Sou uma desastrada. Que droga, eu te acordei.
Guilherme: Ei, ei, ei... Fica de boa. Eu tava no chove não molha aqui. Perdi o sono e vim pra cá. Senta aí, estranha. – Ele riu ao me chamar daquele jeito.
Manuela: Vai pra sempre me chamar assim, né!? – Eu ri ao passar por ele e me sentar no outro sofá.
Guilherme: Enquanto eu não enjoar, vou sim. – Ele continuo deitado no sofá, mas agora estava olhando pra mim. Na verdade, ele olhava pra minha bunda, que estava amostra por causa do minusculo tamanho do shorts do meu pijama.
Manuela: Eu ainda prefiro Manu. – Dei uma disfarçada e tentei abaixar o shorts, sem muito sucesso pelo comprimento.
Guilherme: Posso fazer uma pergunta inconveniente? 
Manuela: Pode.
Guilherme: Como adquiriu todas essas manchas roxas? Metade delas eu aposto que conseguiu batendo nos lugares. – Merda! Ele estava olhando pros meus roxos, não pra minha bunda. Como eu sou idiota. E como eu penso mal das pessoas. Que merda!
Manuela: É... – Meu cérebro demorou um pouco pra formular a resposta. – Meu... Meu pai me presentou.
Guilherme: Que barra. Foi mal pela brincadeira de mal gosto.
Manuela: Tu não faz nem ideia. Fica tranquilo.
Guilherme: Não ta com fome não?
Manuela: Morrendo.
Guilherme: Partiu fazer um sandubão pra gente?
Manuela: De manhã? Ta louco? Nem pensar. Quero leite só.
Guilherme: Ih, mina fresca eu mando logo pra escanteio. Falou!?
Manuela: Não se eu for artilheira. – Abri um sorriso satisfatório pra ele.
Guilherme: Zuou que saca de futebol?
Manuela: Se bobear, melhor que tu. – Eu ri.
Nós fomos para a cozinha, peguei um copo de leite e coloquei achocolatado. Ele fez um lanche enorme com mil coisas dentro. Que coragem de comer aquilo pela manhã. Eca. Continuamos conversando enquanto ele comia. Eu contei toda a minha história, a real história. Pras meninas eu tinha maquiado um pouco. Escondi um detalhes que achei que elas não precisariam saber. Mas eu me sentia mais a vontade com o Guilherme
Guilherme me passava a imagem de irmão mais velho. Eu gostava daquilo. Sem segundas intenções. Eu estava criando um vinculo de amizade com ele. Nada mais. Se bem que, na condição de futura garota de programa, eu não posso me dar ao luxo de me apegar a ninguém.
Guilherme terminou de comer e nós estávamos sentados na mesa da cozinha.
Manuela: As meninas não vão levantar nunca?
Guilherme riu antes de me responder: – Po, elas estão aproveitando pra acordar mega tarde durante a reforma da "casa de show" da minha mãe.
Manuela: Ninguém tinha me falado nada disso.
Guilherme: É, po, elas... Ou no caso, vocês, dançam e depois fazem o programa lá. Ou achou que minha mãe fosse tão doente que deixaria os caras entrarem, fazerem os programas com as meninas com o filho dela no quarto ao lado?
Manuela: Ah, vai saber... – Ele riu absurdamente e eu ri junto, apesar de não ter achado tanta graça assim.
Guilherme: E tu, ta preparada?
Manuela: To claro. Sempre foi meu sonho ser garota de programa.
Guilherme: Sério?
Manuela: Claro que não. – Eu ri. – Esse é um dos maiores pesadelos. Mas a outra opção que eu tenho é ficar na rua e morrer lá, então...
Guilherme: Foda.
Manuela: Chega de falar de mim. Me fala de você. Tu deve amar todas essas meninas bonitas, rodando pela casa com roupa curta, né!?
Guilherme: Confesso que essa parte não é ruim, mas não é bem assim que eu imagino o paraíso. – Ele sorriu. – Eu demorei pra "aceitar" o que minha mãe fazia. Mas eu enchi o saco de tentar fazer ela parar. Ela sabe o que faz.
Manuela: Entendi... E tu deve ter pego todas as meninas já, né não!?
Guilherme: Todas não, agora falta você. – Ele riu e eu ri mais ainda. – Zueira. Po, minha mãe não te falou das "regras da casa"?
Manuela: Falou. Eu só achei que se eu jogasse verde, tu me contaria algo.
Guilherme: Esperta, mas isso tu vai ficar na curiosidade.
Manuela: Ta. Mas tu vai ter que me responder outras coisinhas pra compensar essa "não resposta"– Ele assentiu com a cabeça e eu continuei: – Qual a mais gata?
Guilherme: Antes? Flávia. Agora? Tu. – Fiquei sem graça.
Manuela: Obrigada. Eu sei. – Me fiz de durona. – A mais gostosa?
Guilherme: Isso é mesmo necessário? – Eu ri e afirmei com a cabeça, incentivando-o a continuar. – Bruna não é de se jogar fora não, apesar de ser a mais novinha.
Manuela: Discordo de tu. A Jack é muito mais gostosa.
Guilherme: Ihhhhhhh, é lésbica também, é?
Manuela: Seu sonho me ver pegando uma das meninas, cala a boca.
Guilherme: Cheio de marra já, que isso, ein!? Mas não seria uma visão do inferno. – Eu bati na cabeça dele de vagar. – Para, ou, vou contar pra minha mãe. – Ele fez cara de neném e depois nós rimos juntos.
A Amanda apareceu na cozinha e estava com uma cara de zumbi horrível.
Amanda: Obrigada por me acordarem.
Guilherme: Não tem de que.
Amanda: Do que tanto os pombinhos riam?
Guilherme: Não era da sua cara, fica tranquila. A gente só faz isso na sua frente, é mais hilário.
Ela fez uma cara de nojo, pegou algo pra comer e saiu.
Eu e o Guilherme demos uma geral na cozinha, já que tínhamos bagunçado um pouquinho. As meninas acordaram bem tarde. Helen não estava em casa.
Fui pro meu quarto enquanto a Jack preparava o almoço. Eu era totalmente desprovida de sabedoria de culinária. Mal sabia fritar um ovo e fazer um miojo. Fora isso, eu queimava tudo.
Pela primeira vez, desde que tinha saído de casa eu lembrei do meu celular. Ele estava no fundo da mala, que eu nem tinha desfeito ainda. Peguei-o e tinha umas mensagens da Clara e de uns "amigos" antigos. Minha mãe deve ter falado com eles que eu "sumi". Ou não. Resolvi ignorar o conteúdo de todas as mensagens. Nem olhei, só apaguei. Respondi só a mensagem de Clara. Depois eu acabei pegando no sono.
Acordei com a Flávia entrando no quarto. Toda produzida. Já era muito tarde. Tão tarde que o sol já estava se pondo e eu senti uma fome do cão.
Flávia: Olá, Bela Adormecida.
Manuela: Eu dormi tanto assim? – Me espreguicei e levantei.
Flávia: Ta quase de noite já. Então, sim. – Ela riu. – Guardei um prato pra tu lá no microondas. Sou um anjo, eu sei. A gente vai pra boate hoje. Helen quer dar uma organizada lá e uma ensaiada no nosso showzinho pra inauguração da boate semana que vem.
Manuela: E você me fala isso agora? Como vou me arrumar em 5 minutos?
Flávia riu e falou: – Calma, gata. Você não vai. Não hoje. Helen quer bater um papo contigo antes de tu começar. Não me pergunte do que se trata, porque eu não faço a menor ideia. 
Manuela: Nossa, agora você me tranquilizou. – Disse ironicamente e depois ri. – Ai, eu vou comer.
Flávia: Vai lá.
Desci pra cozinha e as meninas estavam na sala, umas terminando a maquiagem e as outras na indecisão de qual sapato por.
Amanda: Esse azul não combina com o meu vestido preto.
Manuela: Coloca o listrado. Vai ficar lindo.
Ela pegou e colocou o sapato que eu falei. Ficou realmente lindo. Ela me deu um sorriso seco como "agradecimento".
Lua tinha feito umas mechas rosas no cabelo loiro. Ficou lindo. Diferente, mas lindo.
Elas estavam lindas. A Helen chegou com uma van e elas foram pra "boate" que eu estava louca pra conhecer.
Fui pra cozinha, peguei o meu prato e ouvi um barulho vindo dos quartos. Me assustei e peguei uma panela. Fiquei escondida atrás da porta da cozinha. Alguém veio caminhando pela cozinha e eu apareci na frente, ameaçando bater com a panela.
Guilherme: Porra, tu quer me bater com uma panela? – Guilherme falou e coloco a mão na panela, me impedindo de bater nele com a mesma.
Manuela: Ai, que merda, Guilherme! Que susto. Eu esqueci que você estava em casa. Saco.
Ele riu durante um minuto inteiro. Eu estava tão assustada que só ri nos segundos finais.
Guilherme: Tu é lerda, ein, Manu!? Achou que era um assaltante?
Manuela: Vai saber.
Guilherme: Doida de pedra. E solta essa panela antes que me bata de verdade, sem querer. Do jeito que tu é desastrada... 
Manuela: Gentil! – Guardei a panela e esquentei minha comida.

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