terça-feira, 12 de janeiro de 2016

7
...

Me levantei e caminhei até a janela com o pequeno diário na mão. Será que eu conseguiria fazer tudo aquilo antes de.. me suicidar? - Pensei observando o calçadão movimentado. Na esquina de casa tinha um carrinho de cachorro-quente, olhei o rapaz mexendo no purê e meu estômago gritou de fome. Eu vou até lá, como e subo correndo. - Planejei para não encontrar Gustavo de novo.

Sai do apartamento olhando atentamente no corredor, desci de escadas pra fugir se caso ele ainda estivesse ali. Atravessei a rua devagar e parei em frente ao carrinho de lanches.

- O que vai ser hoje? - O rapaz sorriu, ele estava acostumado a me ver sempre por ali.
- Um cachorro-quente completo. - Falei olhando pros lados.
- E pra você? - O rapaz perguntou pra alguém atrás de mim.
- O mesmo. - Eu conhecia aquela voz, não sei de onde, mas eu me lembrava dela. Ela me passava uma calmaria. - Com fome também? - Ele perguntou se colocando ao meu lado.
- Sim. - Respondi baixo e me virei para ver quem era. - Ah, eu sabia que essa voz era conhecida. - Sem perceber sorri.
- Do meu nome você não lembra, mas pelo menos da minha voz você lembrou. - Ele falou rindo e me olhou.

- Ah eu lembro sim. É Sam não é? - Perguntei o olhando.
- Sim. - ele sorriu. - Me sinto privilegiado com isso. Não se você finge ou se esquece mesmo dos nomes das pessoas. - Ele me olhou e abaixou a cabeça com um sorriso estreito no rosto.
- Eu esqueço mesmo, eu juro. - Sorri e peguei o lanche da mão do rapaz. - Bom, você vai comer aqui? - Perguntei sem graça.
- Vou sim. Daqui
a pouco minha irmã chega aqui, hoje não vou fazer janta, sabe como é não é? - Ele riu e se sentou em uma mesinha de plástico na calçada.

- Bom, então acho que vou te fazer companhia até ela chegar. - Falei baixo e me sentei. Ai, não acredito que eu falei isso. Quis morrer quando me dei conta do modo que eu estava agindo.
- Mas e aí, você mora aqui perto? - Ele perguntou me olhando e deu uma mordida em seu lanche.
- Sim, do outro lado da rua. - Apontei pro prédio e mordi o lanche.
- Pertinho da praia. - Ele sorriu.
- Aham, mas eu nem vou muito. - Torci os lábios. - Não sou muito fã de água, pessoas, areia. - Ele me olhou e sorriu novamente.
- Entendo. Do que você é afim então? - Ele perguntou me olhando.
- Ah de skate, corrida, gosto de jogar play também. - Falei insegura e ele riu.
- Você é quase um menininho então. - Ele me olhou e eu dei risada.
- Por aÍ. Gosto de tudo o que uma garota comum odeia. - Falei dando um gole no refrigerante.
- Já tinha percebido isso. - Ele me olhou.

- Sam. - Uma menina baixinha e magra se aproximou de nós com a cara fechada.
- Ah! Oi Lisa. - Sam falou puxando um banquinho pra ela sentar com a gente.
- Quem é? - Ela falou baixinho pra ele.
- Ah é, essa é a Julie, uma amiga. - Ele completou dando ênfase em amiga.
- Hum. Oi Julie, eu sou a Elisa irmã do Sam. - Ela sorrio e eu retribui o sorriso tímida.
- Bom, já vou subir. - Falei me levantando e indo pagar o rapaz do lanche.
- Tchau Julie. - Elisa falou sorrindo.
- Tchau. - Sorri novamente. Eu olhei pro Sam e ele me olhava atento, nossos olhos se cruzaram
e desviei o olhar. - É, tchau Sam. - Falei rápido atravessando a rua.

- Que ridícula. - Resmunguei baixo e entrei no elevador. - Ele vai pensar que eu sou uma idiota. 
- Hein? - Uma garota perguntou me olhando assustada.
- Não estou falando com você. - Revirei os olhos.
- Ata. - Ela resmungou e desceu dois andares abaixo do meu.

Entrei em casa bufando e fui pro quarto.

Melinda Narrando

- Faz um tempo que eu não vejo o Sam. - Falei desanimada sentando no banco da pista de skate.
- Ele está meio ocupadão esses dias. - Rafael respondeu me olhando.
- Entendo. - Resmunguei baixo.
- Por que o interesse? - Ele perguntou curioso.
- Por nada ué. - Me levantei e fui andar de skate novamente.

Eu não sei, mas sempre que vejo o Sam sinto algo estranho na minha barriga. Eu nunca senti isso por outra pessoa, é estranho e constrangedor, pois eu fico com medo de que alguém perceba algo diferente. Nunca me apaixonei por ninguém, sempre fiquei com todos e nunca senti esse negócio estranho.

Ficamos até tarde na pista, depois eu, Bia, Rafael e Gustavo fomos lá pra casa beber alguma coisa e jogar conversa fora.
Assim que chegamos o apartamento estava em um silêncio absoluto. Julie devia ter saído ou já estava dormindo.

- Vamos pedir alguma coisa pra comer? - Bia falou pegando a lista telefônica.
- Demoro. O que vocês vão querer? Pizza? 
- Pode ser né? - Bia falou olhando pra mim que dei positivo com a cabeça.
- E a Julie? Não vai comer? - Rafael perguntou olhando a lista.
- Ela já deve ter comido Rafa, nem sei se ela tá aqui. - Respondi colocando os pratos na mesa.
- Entendo. Guto a hora que você veio aqui ela estava? - Rafael perguntou olhando Gustavo.

- Sim, e me mandou embora. - Nós rimos.
- Essa é a Julie que eu conheço. - Bia falou rindo.
- Acho que estou apaixonado. - Gustavo falou suspirando.
- Você sempre diz isso. - Rafael o encarou.
- Eu sei, mas dessa vez eu juro que é diferente. - Ele sorriu.
- Desencana Guto, a Julie nunca daria moral pra alguém como você. - Falei o olhando.
- Por que? - ele perguntou frustrado.

- Julie não faz o estilo que combina com você, ela não é nem um pouco carinhosa e nem tão pouco educada. - Fui sincera.
- Imagina a mamãe conhecendo Julie. - Rafael se intrometeu e riu.
- Um desastre. - Bia falou do outro lado da sala.
- Mas eu não me importo com o que ela acha. - Gustavo falou olhando pro Rafa.

- Nem eu. - Os dois riram e eu e Bia olhamos de canto.
- Sua mãe deve ser um amor hein. - Falei rindo.
- Só conhecendo pra saber, é quase a Cruela em vida. - Rafael falou rindo.
- Que dó. - Bia e eu rimos.
- Posso usar o banheiro? - Gustavo perguntou-me.
- Pode. Por aqui. - Levei ele até o corredor. - É a última porta. - Apontei e voltei pra sala.
Gustavo Narrando

Andei devagar pelo corredor, fui observando as fotos na parede e os enfeites pendurados. 

Tinha uma porta com uma brecha aberta, curioso eu espiei e vi Julie deitada, parecia estar dormindo. Abri a porta cuidadosamente e caminhei levemente até ao lado de sua cama, onde havia uma cômoda. Em cima dela tinha fotos, recortes de jornal e um perfume. Abri a tampinha do perfume e inalei aquele cheiro, era um cheiro suave e marcante, típico de garotas ousadas, de certo era da Julie. 

Caminhei até ao lado da cama onde ela dormia feito um anjo.

- Só assim pra parecer calma. - Sussurrei olhando-a.

Seus lábios formavam um pequeno biquinho e seu cabelo loiro cobria parte de seu rosto meigo. Ela segurava um pequeno caderninho. Me abaixei e tirei a mecha de cabelo caída em seu rosto.

- O que você tá fazendo aqui? - Bia perguntou baixo ao me ver no quarto.

- Nada. - Me levantei e fui saindo do quarto.

- Errou de porta é? - Bia deu risada.

Dei risada baixo e sai do quarto indo em direção ao banheiro.

O quarto era todos em tons claros e com os detalhes todos pretos, o guarda-roupa, cama, cômoda, criado mudo eram todos pretos e brancos a cortina era a única parte colorida do quarto, ela era em um tom verde limão claro, os porta retratos tinham a mesma cor verde e tinha uma poltrona preta no canto perto da janela. Entrei no banheiro e um sorriso largo tomou conta do meu rosto. Lavei o rosto com água fria, sequei e voltei para a sala.

Bia me olhou e deu risada e eu fingi que nada havia acontecido.

- Esse final de semana tem campeonato de skate lá na pista né. - Rafael falou pra Melinda.

- Aham. Aposto 10 reais que a Julie ganha na feminina. - Ela falou olhando Rafael.

- Certeza. Você vai participar? - Ele perguntou olhando-a.

- Não. Apenas Julie, ela vai representar nós duas, né Bia? - Bia confirmou com a cabeça e voltou a comer a pizza.

- Queria saber andar de skate também. - Me intrometi na conversa.

- Aprende ué. - Melinda me olhou e sorrio.

- É. Se o Rafael me ensinasse. - Revirei os olhos.

- Ah! Você é muito lento pra aprender, toma muito meu tempo. - Rafael se defendeu e mordeu a pizza de calabresa.

- Pede pra Julie. - Melinda me olhou e sorriu.

- Ela não abre nem a porta pra eu entrar, quanto mais me ensinar a andar de skate. - Nós rimos.

- Se você pagar ela ensina. - Melinda piscou. - Ela sempre dá aulinhas aos sábados pros pivetes lá na pista.

- Demorou então hein. - Sorri bobo. - Pagar não será problema, mas vamos ver se ela aceita.

Passamos mais um tempo lá comendo, conversando e rindo e depois eu e Rafael fomos embora.

Julieta Narrando

Acordei quebrada no dia seguinte, acabei pegando no sono de tênis e tudo. Me levantei antes mesmo de Melinda vir me chamar, me arrumei e sai do quarto com a pior cara do mundo.

- Que bagunça
é essa? - Perguntou olhei pra pia cheia de pratos.

- Ontem os meninos vieram comer aqui. - Bia me respondeu e foi pro banheiro.

- Que meninos Melinda? - Perguntei olhando de canto.

- Rafa e o Guto. - Ela me olhou e sorriu.

- Graças a Deus eu estava dormindo. - Falei baixo e aliviada.

- Tá fugindo de alguém? - Melinda perguntou me olhando.

- Não. não. - Respondi tomando suco.

- Sei. - Ela me olhou desconfiada e riu. - Ah arrumei outro aluno pra você. - Ela me olhou.

- Vai pagar? - Falei dando mais um gole no suco.

- Lógico né. - Ela revirou os olhos. - Ele começa sábado contigo lá no Ralf.

- Beleza. Que horas? 

- 8h30 tá bom? - Ela me olhou.

- Tá né, fazer o quê. - Peguei minhas coisas e fui escovar os dentes para sairmos.

Estávamos quase chegando na escola quando um carro parou do nosso lado e Rafael saiu dele sorrindo. Gustavo abaixou o vidro e me deu um oi, o que foi em vão pois eu não respondi.

- Sábado, 8h30 né? - Ele perguntou e eu fiquei em choque. O novo aluno era ele, não acredito.

- Ah não, pra você eu não ensino. - Revirei os olhos.

- Ensina sim, vou te pagar. Só quero aprender, nada pessoal. - Ele falou me olhando.

- Vou pensar. 

- Por favor. - Ele falou manhoso.

- Tá bom, mas com uma condição. - Eu o olhei séria.

- Qual? 

- Você só vai conversar comigo sobre skate, nada pessoal. - Eu o encarei.

- Se você quer assim, por mim tudo bem. 

- Ótimo, sábado, 8h30 lá no Ralf, se eu chegar lá e você não estiver eu vou embora e você não precisa nem me procurar pra
te ensinar de novo. Okay? - Disse autoritária.

- Você é exigente hein. - Ele riu.

- Um pouco. - Eu o olhei e soltei um sorriso. Mas logo que percebi fechei a cara e me afastei do carro.

- Até sábado. - Ele gritou enquanto eu entrava na escola.

O colégio estava uma bagunça naquele dia, tinham despedido o inspetor de alunos. Estava uma barulheira nos corredores e ninguém estava respeitando nada, inclusive eu. 

A diretora gritou por silêncio e disse que tinha um comunicado aos alunos, de certo era sobre o novo inspetor.

- Bom dia queridos. Como vocês viram estamos sem inspetor de alunos, mas já contratamos outro, ele começa amanhã. - Ela falou nos olhando com aquela cara de rata. - Então peço que vocês colaborem hoje. - Ela sorriu e a gritaria começou.

- Sem inspetor. - Uns garotos gritavam. - Bora lá pro fundo fumar. - Eles falaram um pro outro e eu olhei assustada pois esses garotos viviam juntos com a Bia.

A diretora mandou todos para as suas respectivas salas e logo o pátio ficou vazio. O professor da primeira aula da Mel havia faltado, então levaram eles pra minha sala.

Ela sentou-se ao meu lado e ficamos conversando sobre a competição que teria e sobre os concorrentes.

- Você vai participar Julieta? - Um garoto da sala da Mel se intrometeu na conversa.

- Sim. - Respondi seca.

- Então eu vou lá assistir. - Ele deu uma piscadinha e riu.

- Tanto faz. - Fiz cara de nojo e voltei a falar com a Mel ignorando o garoto.

Eu odiava estar no 2º ano ainda, por conta do orfanato estou atrasada, era pra eu ter terminado e me formado já, mas infelizmente ainda estou aqui com esses pirralhos. A maioria deles tem quinze, dezesseis anos e pouquíssimos tem dezessete, eu por exemplo sou a mais velha da turma, embora muitos não saibam, pois não falo com quase ninguém, ainda mais da minha vida.

- Você vai ganhar Julie, tenho certeza. - Mel sorriu e me deu um leve tapinha no braço.

- Não quero cantar vitória antes da hora, mas se eu ganhar vou pegar o premio e comprar um violão. - Sorri.

- Apoio completamente, estou com saudade de ouvir você arranhando as cordinhas. - Mel me olhou e riu.

- Agora eu sei tocar, não vou mais arranhar cordinha. - Demos risada.

Um tempo depois bateu o sinal e Mel retornou pra sua sala me deixando sozinha lá com aqueles animais. Depois só nos encontramos no intervalo e por fim na saída.

Fomos embora caminhando e depois de almoçar eu fui pro serviço. Felizmente hoje eu estava sozinha na loja e fiquei cantarolando praticamente o dia todo.

Amanhã será sexta-feira e vai ter um racha na saída da cidade. Eu era louca pra dirigir um carro

daqueles a mil por hora. - Sorri boba com o meus pensamentos.

Meu patrão chegou na loja, me pegou e me dispensou mais cedo, eu aproveitei pra fazer o número 7 da lista. Fui caminhando até a praia e me sentei na areia seca e quente. Prendi o cabelo em um coque desarrumado e coloquei o óculos de sol, não que ainda estivesse muito sol, mas eu não

queria correr o risco de ser reconhecida.

Pensei no que eu faria com o meu salário desse mês, pensei um pouco e tive uma brilhante ideia. Juntei minhas coisas e sai correndo pro tal lugar, quando cheguei lá estava vazio, pra minha sorte é claro.

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